A estrada de acesso a comunidade Maravilha beira o Rio Madeira. |
O Rio madeira desde a chegada dos
colonizadores, portugueses e espanhóis ainda no século XVII é alvo de políticas colonizadoras,
devastadoras, desenvolvimentistas. Aqueles discursos colonizadores de que era
preciso trazer a civilização, o progresso e que para isso fazia-se necessário
acabar com os Mura, pois foram os Mura que retardaram a entrada dos
colonizadores na Amazônia via Rio Madeira, por sem anos. Por esse motivo, a
coroa Portuguesa declarou guerra justa contra nós Mura.
Desde então, nunca sessou a
guerra pela disputa de espaço com os que impõe a visão civilizatória e
desenvolvimentista, desconsiderado a existência dos povos indígenas e
populações tradicionais, nossos conhecimentos das tecnologias tradicionais e
modos de vida repassados milenarmente. Por esses dias mesmo numa conferência de
encerramento do plano diretor da cidade de Porto Velho, na assembleia
legislativa, ouvi uma fala de representante do poder público dizendo que era
preciso levar a civilização e o desenvolvimento para o outro lado do rio, contrariando
todo o processo de construção coletiva do plano diretor e dando força para o
interesse empresarial e as frentes do agronegócio e nas intenções de expansão da cidade e ao
mesmo tempo na construção de mais portos graneleiros.
Chegando na comunidade Maraviha. |
A comunidade Maravilha que
permanece resistindo a todos os ataques que se acirraram desde a construção das
hidrelétricas e posteriormente a construção de uma ponte atravessando o rio,
agora também teve que enfrentar a situação do incêndio descontrolado. Nós do
coletivo Mura de Porto Velho estivemos lá no domingo dia 25 para ver de perto a
área afetada pelo fogo e para somar forças com a comunidade.
Fomos com nossas crianças para a
comunidade, elas estavam cientes que íamos fazer um trabalho extremamente
importante e tinha a ver com as queimadas. Ao chegarmos na casa da pessoa que
se comprometeu em nos levar na área queimada, sentimos um forte
De onde estava vindo o cheiro de óleo diesel. |
cheiro de óleo
diesel que estava vindo de uma balsa atracada às margens do Rio Madeira e que
estava sendo lavada. Ali há uma concentração de balsas de carga de grãos
levados até Manaus, esse porto irregular de cargas e descargas dessas balsas
acabam por acelerar o desbarrancamento também causado pelas hidrelétricas e
garimpagem.
Quem nos recebeu foi Doriam, um
morador que vive na comunidade a 10 anos, ele nos disse que veio do interior da
Argentina com a intenção de chegar até Manaus, mas quando chegou à comunidade
Maravilha, tomou a água do Rio Madeira e não quis mais sair de lá, há dez anos
vive aliado a defesa das árvores, dos igarapés, dos lagos dos animais.
Ele mostrou conhecer bem aquela floresta e foi nos mostrando cada palmeira,
cada árvore, falando seus nomes e sua importância, transparecendo o seu pesar
por estarem queimadas.
Adentrando na floresta queimada - Fundiária da reserva ecológica. |
Não conseguimos adentrar muito na
floresta para ver toda a área afetada pelo fogo, mas o pouco que adentramos, vimos que os pés de patoá não resistiram ao
fogo, vimos três pés, dois caídos e o outro com o tronco queimado que está
condenado a morrer. Para quem não sabe o que é patoá é um fruto que lembra o
açaí ou abacaba e que faz parte da alimentação tradicional, é como se fosse um
achocolatado. Outras palmeiras e demais árvores também estavam com suas bases
queimadas, porque o fogo foi alastrando por baixo.
Os moradores tradicionais da
comunidade estão receosos de falar sobre o fogo e demais devastações que a
comunidade vem sofrendo a tempo. Segundo informações que adquirimos a
estradinha que um setor governamental abriu em 2014 com o pretexto que ia
facilitar para a comunidade sair após as águas (da inundação causada pelas hidrelétricas) baixar, mas ao contrário, serviu
para a facilitação da entrada de invasores, inclusive de um fazendeiro
que tem uma grande área invadida e desmatada dentro da comunidade.
Foi triste entrarmos na fundiária
da reserva Arirambas com um tapete de fogo que queimou área a dentro, que
conforme vimos aumentou a insegurança alimentar daquela comunidade, pois caíram
os pés de patoá adultos que levaram em torno de 100 anos para estarem no porte
que estavam, mas se mostraram sensíveis ao fogo, sementes que são utilizadas para a
confecção de artefatos culturais também foram queimadas e várias árvores foram
afetadas.
Uma das senhoras, moradora
tradicional nos recebeu da janela da sua casa, falou que a área que está sob a
responsabilidade dela e do filho, não queimou, pois eles não costumam fazer
queimadas. Ela não quis que gravássemos
a fala dela e nem registrasse a sua imagem, mas nos contou que ela e seus
filhos ficaram assustados com o fogo. Não gravamos a fala dela, nem
fotografamos a sua casa de farinha e sua roça, mas vimos que ela mantém a
floresta em pé e mantém seu modo tradicional de produzir seus alimentos.
Outro senhor que teve suas plantações e sua casa cercada pelo
fogo não quis falar muito sobre o assunto, diferente da Dona Conceição que vive
na comunidade Maravilha a 60 anos e que não teve medo de falar do que vem
afetando a eles. Nos levou até o lago e mostrou as árvores que morreram ainda
no tempo da inundação de 2014, causada pelas hidrelétricas, falou da
preocupação com homens que segundo ela, deram a entender que vieram de Manaus, os quais adentram no lote e ficaram falando em tornar o local num porto graneleiro. Ela também
nos contou que no dia que estava pegando fogo (semana passada) ela e seu esposo
ficaram muito preocupados, porque não sabiam de onde estava vindo a fumaça,
somente depois quando um mulher com sua família chegou assustada falando que na
parte de trás estava pegando fogo, foi quando souberam os motivos das fumaças e
então foram até a beira do barranco e viram que a fumaça estava em cima da água
do rio e se assustaram.
Conversando com dona Conceição.
Esse lago sofre invasão de pescadores predadores vindos da cidade.
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Apesar de todas essas ameaças, dona Conceição se
despediu de nós com uma fala cheia de esperança e resistência, “Se nós somos fortes e somos guerreiras,
perseverantes, é porque os nossos antepassados era índios e nós também temos
esse sangue, temos essa essência de sermos lutadora, de não desistir fácil! É
com essa fala que encerro essa descrição e convido a todas e todos a somar com
a luta dessa comunidade em se manter dentro de seus modos de vida tradicional
que está extremamente ameaçado, vários de seus direitos estão sendo violados,
dentre eles, a educação escolar, pois conforme nos falaram, a escola se encontra
fechada e nem se quer foi encerrado o ano letivo de 2018. Há ainda um grande
risco de haver um incêndio maior na comunidade, pois a área que pegou fogo
ficou seca e alguns trocos de arvores caídos estão com brasas e continuam
queimando, na volta da área de queimadas vimos uma fumaça, um dos nossos foi
verificar, era uma tronco pegando fogo, para evitar que viesse a pegar fogo na
vegetação seca que estava nas proximidades o tronco foi tirado e deixado às
margens da estrada, porém, em toda a área que pegou fogo os ricos estão eminentes.
Até enquanto só se matava indio o mundo dormia e fazia pouco caso. Mas agora que tocaram no que realmente interessa a eles então agora estão mobilizados e articulados para proteger a mata, rios, animais a biodiversidade. Indígena, não. resistencia sempre
ResponderExcluirNós vamos continuar resistindo apesar de toda a política genocida.
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