Chegou janeiro de 2020 veio as comemorações de passagem do ano velho para o ano novo, mas o que não foi concluído no ano que passou teve que continuar. Não fiz minha viagem para o Amazonas, onde percorro os caminhos das águas acentrais Mura, por que não tive férias em Janeiro, nem eu nem os demais professores da escola estadual de Nazaré. As dificuldades na escola só aumentaram, a infra-estrutura para trabalhar ficou ainda mais precária.
Como foi difícil esse mês de janeiro, ainda assim, foi possível realizar alguns momentos de interação e construção de conhecimento coletivos.
No meio de toda essa dificuldade aconteceu uma coisa maravilhosa! Nós da Maloca Querida participamos do projeto pindorama dirigido por minha irmã, um projeto gestado durante todo o ano de 2019 junto com minha irmã Maíra, ela que criou o espetáculo eu só contribuí compartilhando nossos conhecimentos culturais e trocando ideias sobre decolonização. Fazer essa troca de saberes com minha irmã foi muito importante para mim, porque não era apenas trocas conceituais, mas sim, partilha de conhecimentos repassados de geração a geração e também um processo de afirmação indígena que ela estava começando.
O espetáculo Pindorama foi muito ancestral, foi lindo, foi incrível! todo ele, cada apresentação. Fiquei imensamente feliz quando vi as criancinhas fazendo uma coreografia da música Pindorama e a partir daí foi só uma emoção atrás da outra. Foi tão simples e tão incrível ao mesmo tempo. A escolha das músicas, cada movimento, cada expressão, cada silêncio, cada grito, cada choro, tudo foi verdadeiro, foi realizador.
Foram dois dias intensos de realizações, a técnica desapareceu e transcendeu a ancestralidade, a emoção. Os corpos em movimentos com suas histórias que saíam do silenciamento, da exclusão, da marginalização, o belo da nossa cultura e a flecha apontada para todo o etnocídio e o berimbau para enfrentar todo o racismo.
Quem foi prestigiar, teve a oportunidade de ver, de sentir, toda nossa força ancestral!
Primeiro apresentamos Pindorama território ancestral, música da Kaê Guajajara com coreografia criada e apresentada por Letícia e Lulidimilla, na Maloca Querida, Porto Velho. Depois os grandes momentos no palco do SESC de Porto Velho, o projeto Pindorama possibilitou que crianças, adolescentes, jovens e adultas invisibilizadas mostrassem suas forças de expressão artística enquanto vida e história marcadas em seus corpos. Foi tão lindo! Tão forte! que eu não podia deixar de levar para a escola para que as alunas e alunos tivessem a oportunidade de prestigiar pelo menos um pouco de tanta coisa linda.
Conseguimos eu e Iremar com a parceria de aliados levar as três para Nazaré, as bailarinas Mura que puderam compartilhar com as crianças da escola do turno matutino a força da cultura e do pertencimento identitário por meio da dança. Foi um momento muito bonito que passou uma mensagem linda para as crianças de que elas não desistam de seus sonhos e estejam onde estiverem não tenham vergonha de sua cultura.
Como o ano letivo de 2019 ainda se arrastava em Janeiro de 2020, não houve abertura para que as meninas se apresentassem no período da tarde, tendo que pela manhã fazer uma ocupação Mura para poder garantir essa partilha maravilhosa tão bem recebida pelas crianças da escola.
Essa imagem concentra a grandeza do espetáculo Pindorama e como é representativo para min está ali do lado da Maíra. |
Na escola Francisco Desmorest Passos em Nazaré falando do sentimento de afirmação Mura |
A acolhida das crianças às bailarinas Mura |
Ludimilla fazendo sua arte na Maloca Mura |
Letícia também deixando sua arte nas paredes da maloca Mura |
O mês de Janeiro seguiu pesadamente, mas com fôlego do respiro de arte, de ânimo, de valorização cultural que as meninas puderam compartilhar conosco na escola.
Entrou Fevereiro, as coisas ficaram mais difíceis na escola, muito cansaço, falta de merendeira, falta de estrutura para trabalhar, alguns conflitos, pressões, energias negativas circulando.
Quando tudo ficou muito pesado, o amor, a amizade, a fé, a esperança nos manteve firmes. Estávamos indo aos tranco e barrancos superando as dificuldades. Entrou Março, faltava pouquinho para enfim vencermos essa pendência de 2019, que não foi nossa responsabilidade, mas sim do próprio Estado que negligenciou a garantia do direito ao transporte fluvial para o deslocamento dos alunos e alunas, fazendo com que as aulas se iniciassem apenas em outubro de 2019, íamos fechar tudo agora final de Março, ai chegou a pandemia do corona vírus. Agora é esperar tudo passar para reunirmos forças para concluir esse pesado ano letivo de 2019.
Não bastasse o tal do desenvolvimentismo que só nos traz mortes com as tais hidrelétricas e rodovias, mais um mal que nos ameaça esse tal corona vírus que coloca em risco nossa vida e nosso espaço de vida.
Que a arte ancestral permaneça viva!
Que a arte ancestral permaneça viva!
Que Namatuiky e a força de nossos ancestrais nos fortaleça! Anemipa!
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